quarta-feira, abril 17, 2002


Eu estou apaixonado por um livro, um livro ordinário que ninguém ouviu falar e que eu comprei em uma oferta, em um estado pra lá de lastimável. Chama-se The Moviegoer e eu estou arrasado que ele vá acabar. Tenho prolongado essa agonia tanto quanto possível, mas como dizem os profetas do apocalipse, o fim está próximo.
Esse é sempre um momento traumático para os leitores. Você vai ser expulso de um mundo familiar, que você aprendeu a amar. Claro, você sempre pode reler, mas há uma sensação de trapaça. E as cenas se repetem. Não sei se como farsa, como na ilustre frase, mas sem o mesmo brilho. Não, a primeira leitura é tragicamente irrecuperável.
O livro é cuidadosamente não-estrelado por Binx, o moviegoer do título, alguém que falseia tanto quanto possível para não viver de verdade. Ele engana. Ele tem um trabalho aquém das suas possibilidades intelectuais, tem affairs com as secretárias e quando a vida ameaça se manifestar, vai ao cinema. É o suficiente para que a vida, de fato, não aconteça. Quem não consegue se enganar é Kate,uma meia-prima de Binx, que vê através de todos esses esquemas e, amparada por uma herança razoável, escapou do trabalho, do casamento e de tudo que pudesse distraí-la. Tragicamente, eles não conseguem gostar o suficiente um do outro para que algo aconteça. Cada um fareja o farsante no outro. Então eles falam sem se falar e se entendem em silêncios e em alusões obscuras, pequenos jogos mentais sem humor que não servem de consolo. Kate está mais próxima do abismo. Binx assiste e preferia não assistir. Entre uma secretária e outra ele chega a pensar em casar-se com ela, com uma salvação patética para os dois.
Patético é esse resumo, mas é o tipo de livro que não pode ser resumido. Eu antecipo que não há solução possível para o enredo, também, e que eles vão simplesmente me abandonar, me deixando com minha própria vida para cuidar. Então eu leio meio capítulo, em um momento cuidadosamente selecionado e lamento mais um pouco.

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