terça-feira, março 21, 2006

cartas cariocas 1

direto das areias escaldantes. ou pelo menos eu imagino que elas sejam, quando passam pela janela do ônibus. e montanhas. não passa um minuto sem que uma montanha deslize silenciosa entre um prédio e outro. mas isso todo mundo sabe, não? aliás, minha teoria sempre foi de que o conhecimento terceirizado nos deixava todos insensíveis à experiencia real, mas posso estar errado. clichês se confirmam: não é tão quente, os cariocas realmente dão informações com uma simpatia brasileira e uma calma tibetana... atravessar ruas é um esporte radical. ou um jogo de paciência.

já tomei uma meia dúzia de chopes, peguei uns 8 ou 9 ônibus... ainda longe de ser um especialista. mas me sinto mais habilitado na categoria sobrevivência urbana. um reality show pessoal.

já falei das montanhas? elas estão lá, por toda parte, verdes, imensas. enquanto os passageiros dormem, o túnel passa e eu passarinho. o resto, depois, eu suponho.

EDIT: eu devia explicar melhor, eu sei. mas o tempo é meio roubado ainda. e os meios... quando estou balançando na rede, de frente para a floresta da tijuca à noite, coisas melhores me ocorrem, mas aquele notebook não chegou ainda. um dia chega. um diário noturno, digitado da rede sairia melhor, eu suponho.

um bichinho meio marsupial deslizou ontem pelo fio da luz enquanto eu pensava. curioso estar tão perto da natureza. a cidade é uma invasão enorme no meio desse paraíso tropical.

ainda sem relógio, em meu retiro longínquo, durmo cedo e acordo com a luz invadindo a janela. depois desço para c idade e começa o curso de sobrevivência urbana. mas é gentil, não é brutal esse percurso. a beleza das suburbanas, as moças que parecem índias, mesmo o calor é gentil, não é aquele paredão de infeno do verão do sul. já no segundo dia o desenho da cidade parece querer fazer sentido, você entende que se move de lá pra cá, que se almoça no escritório, que uma vida existe e é uma questão de aprender não o sotaque, mas a prosódia, se entendo bem a palavra. o ritmo. claro, não existe uma vida aqui, mas vidas. muitas. a tolerância nos faz deslizar entre elas. e como dizia lenine, gentileza é fundamental.

(lendo olga e vendo a cidade também com os olhos alemães dela, a bela armada protegendo o cavaleiro da esperança pelas ruas do rio. e é possível que eu atravesse de ônibus, com o livro na mão, uma rua que ela cruzou.)

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