woodstock na estação fantasma
a estrada não estava vazia ontem. a parada onde pego meu segundo ônibus para ir para casa, uma espécie de estação de trem fantasma toda grafitada, estava repleta de pessoas de branco. todos iam "para a igreja". a igreja do santo daime, que fica no caminho de casa. embora os relatos digam que vá todo tipo de gente, a presença neo-hippie era avassaladora. a clássica princesinha-hippie-do-calcanhar-sujo e seu(s) parceiro(s). com a dominância do branco sobre a indefectível bata indiana. pelo que me lembro de meu brevíssimo estágio em woodstockland, a sensação mais confortante era a de pertencer. a algo. a mesma coisa que deve sentir alguém da tribo dos-de-preto ou dos carecas do subúrbio, tanto faz. mas a facilidade de, através de um dress code nada informal, identificar um semelhante. tão fácil, não? lembro que foi essa a perda que senti quando desisti de usar o uniforme. eu teria que usar outras ferramentas para achar interlocutores. eu tinha abandonado as facilidades da tribo.
nesses dias, eu tento muito ser invisível. mas eu lembro do conforto de pertencer.
sexta-feira, março 31, 2006
quinta-feira, março 30, 2006
como disse gabi, a sabedoria da borboleta foi foda. e como disse m., blame it on the sun. hoje, enfim, um filme cinza cobre a cidade e me encontro mais sóbrio. de fato, a sabedoria da borboleta parece um nome ótimo para um livro de auto-ajuda. "como resolver sua depressão, problemas de peso, fumo e alcoolismo com a sabedoria da borboleta."
jorge, vou enfim ler a pior banda do mundo. recuperada em porto alegre, guardada na mudança, lembrei dela hoje. deve ser esse clima europeu que retorna.
sábado vou conhecer santa teresa. segue o avanço lento sobre a cidade, com passos de caranguejo: de lado.
jorge, vou enfim ler a pior banda do mundo. recuperada em porto alegre, guardada na mudança, lembrei dela hoje. deve ser esse clima europeu que retorna.
sábado vou conhecer santa teresa. segue o avanço lento sobre a cidade, com passos de caranguejo: de lado.
segunda-feira, março 27, 2006
o artista em crise, pág 622
cada cigarro fumado no pátio tenta ser um reset. nossa mente produtiva precisa de vírgula. sou capaz de sentar e fazer trinta capas em meia hora, mas daí também não sei mais se sou moby dick ou paulo coelho. ou algo assim. você fica fumando, atordoado pelas imagens que você mesmo escolheu e pensa: que foi mesmo que eu esqueci? qual era o meu projeto? não o gráfico, que esse está em andamento, mas o outro, aquele da sombra do coração.
e às vezes você não lembra.
cada cigarro fumado no pátio tenta ser um reset. nossa mente produtiva precisa de vírgula. sou capaz de sentar e fazer trinta capas em meia hora, mas daí também não sei mais se sou moby dick ou paulo coelho. ou algo assim. você fica fumando, atordoado pelas imagens que você mesmo escolheu e pensa: que foi mesmo que eu esqueci? qual era o meu projeto? não o gráfico, que esse está em andamento, mas o outro, aquele da sombra do coração.
e às vezes você não lembra.
primeira praia. depois, ontem, as águas de março. torrenciais. e hoje, uma borboleta incrivelmente azul escapou do jardim lage e cruzou meu caminho. atravessou a calçada, foi pro trânsito e quase vi ela se espatifando contra um ônibus, mas sabiamente no último minuto ela cruzou de volta para a sombra pesada do parque. azul, azul. e o parque aquela coisa: a sombra verde de onde o sol não entra, úmida. os muros verdes de limo. lembra você que um outro mundo existe, indo pro trabalho.
quinta-feira, março 23, 2006
oi coração/ não dá pra falar muito não/espera passar o avião/assim que o inverno passar/ eu acho que vou me mudar. sair do meu exílio bucólico nas montanhas. conto quando e se. ontem rodei por ipanema e achei a cara do bomfim. mas vou pra lapa. vi a praia hoje, às 6 e meia da manhã. descobri que quase ninguém fuma aqui. uno se sente mais e mais proscrito com essa droga. descobri que um modesto sanduíche na verdade vira uma epopéia de pernil. não dá pra reclamar. acordei em copacabana, princesinha do mar, onde os plebeus dormem na praia e os bons súditos caminham, bronzeados. e vi um castelo de areia gótico da minha altura. e um nordestino dizia: se bate o coração, tô passando a mão. baby bye bye.
quarta-feira, março 22, 2006
terça-feira, março 21, 2006
cartas cariocas 1
direto das areias escaldantes. ou pelo menos eu imagino que elas sejam, quando passam pela janela do ônibus. e montanhas. não passa um minuto sem que uma montanha deslize silenciosa entre um prédio e outro. mas isso todo mundo sabe, não? aliás, minha teoria sempre foi de que o conhecimento terceirizado nos deixava todos insensíveis à experiencia real, mas posso estar errado. clichês se confirmam: não é tão quente, os cariocas realmente dão informações com uma simpatia brasileira e uma calma tibetana... atravessar ruas é um esporte radical. ou um jogo de paciência.
já tomei uma meia dúzia de chopes, peguei uns 8 ou 9 ônibus... ainda longe de ser um especialista. mas me sinto mais habilitado na categoria sobrevivência urbana. um reality show pessoal.
já falei das montanhas? elas estão lá, por toda parte, verdes, imensas. enquanto os passageiros dormem, o túnel passa e eu passarinho. o resto, depois, eu suponho.
EDIT: eu devia explicar melhor, eu sei. mas o tempo é meio roubado ainda. e os meios... quando estou balançando na rede, de frente para a floresta da tijuca à noite, coisas melhores me ocorrem, mas aquele notebook não chegou ainda. um dia chega. um diário noturno, digitado da rede sairia melhor, eu suponho.
um bichinho meio marsupial deslizou ontem pelo fio da luz enquanto eu pensava. curioso estar tão perto da natureza. a cidade é uma invasão enorme no meio desse paraíso tropical.
ainda sem relógio, em meu retiro longínquo, durmo cedo e acordo com a luz invadindo a janela. depois desço para c idade e começa o curso de sobrevivência urbana. mas é gentil, não é brutal esse percurso. a beleza das suburbanas, as moças que parecem índias, mesmo o calor é gentil, não é aquele paredão de infeno do verão do sul. já no segundo dia o desenho da cidade parece querer fazer sentido, você entende que se move de lá pra cá, que se almoça no escritório, que uma vida existe e é uma questão de aprender não o sotaque, mas a prosódia, se entendo bem a palavra. o ritmo. claro, não existe uma vida aqui, mas vidas. muitas. a tolerância nos faz deslizar entre elas. e como dizia lenine, gentileza é fundamental.
(lendo olga e vendo a cidade também com os olhos alemães dela, a bela armada protegendo o cavaleiro da esperança pelas ruas do rio. e é possível que eu atravesse de ônibus, com o livro na mão, uma rua que ela cruzou.)
direto das areias escaldantes. ou pelo menos eu imagino que elas sejam, quando passam pela janela do ônibus. e montanhas. não passa um minuto sem que uma montanha deslize silenciosa entre um prédio e outro. mas isso todo mundo sabe, não? aliás, minha teoria sempre foi de que o conhecimento terceirizado nos deixava todos insensíveis à experiencia real, mas posso estar errado. clichês se confirmam: não é tão quente, os cariocas realmente dão informações com uma simpatia brasileira e uma calma tibetana... atravessar ruas é um esporte radical. ou um jogo de paciência.
já tomei uma meia dúzia de chopes, peguei uns 8 ou 9 ônibus... ainda longe de ser um especialista. mas me sinto mais habilitado na categoria sobrevivência urbana. um reality show pessoal.
já falei das montanhas? elas estão lá, por toda parte, verdes, imensas. enquanto os passageiros dormem, o túnel passa e eu passarinho. o resto, depois, eu suponho.
EDIT: eu devia explicar melhor, eu sei. mas o tempo é meio roubado ainda. e os meios... quando estou balançando na rede, de frente para a floresta da tijuca à noite, coisas melhores me ocorrem, mas aquele notebook não chegou ainda. um dia chega. um diário noturno, digitado da rede sairia melhor, eu suponho.
um bichinho meio marsupial deslizou ontem pelo fio da luz enquanto eu pensava. curioso estar tão perto da natureza. a cidade é uma invasão enorme no meio desse paraíso tropical.
ainda sem relógio, em meu retiro longínquo, durmo cedo e acordo com a luz invadindo a janela. depois desço para c idade e começa o curso de sobrevivência urbana. mas é gentil, não é brutal esse percurso. a beleza das suburbanas, as moças que parecem índias, mesmo o calor é gentil, não é aquele paredão de infeno do verão do sul. já no segundo dia o desenho da cidade parece querer fazer sentido, você entende que se move de lá pra cá, que se almoça no escritório, que uma vida existe e é uma questão de aprender não o sotaque, mas a prosódia, se entendo bem a palavra. o ritmo. claro, não existe uma vida aqui, mas vidas. muitas. a tolerância nos faz deslizar entre elas. e como dizia lenine, gentileza é fundamental.
(lendo olga e vendo a cidade também com os olhos alemães dela, a bela armada protegendo o cavaleiro da esperança pelas ruas do rio. e é possível que eu atravesse de ônibus, com o livro na mão, uma rua que ela cruzou.)
sexta-feira, março 17, 2006
quarta-feira, março 01, 2006
o que me lembra daquele conto clássico de borges, onde o borges velho encontra seu eu jovem. o que eu faria se encontrasse meu jovem eu? é inútil, não? o que você pode dizer que evite toda a miséria futura, os embarações, os equívocos lamentáveis?
suspeito que se você o encontrasse ainda criança, ficaria seriamente tentado a torcer aquele pescocinho e abreviar as coisas.
suspeito que se você o encontrasse ainda criança, ficaria seriamente tentado a torcer aquele pescocinho e abreviar as coisas.
a pior coisa da mudança? ter que abrir aquela caixa apavorante chamada "personal stuff". essa é sua vida. oh boy. o horror, o horror de ler o que você escrevia aos 18 anos. cadernos e cadernos. que você vem arrastando há anos. desenhos. cartas. diários. fotos.com minhas próprias coisas ainda consegui ser bem impiedoso, mas o que fazer com uma carta da sua irmã de quando ela tinha 10 anos? ahhhhh. dilacerante. o afeto, a ingenuidade, a infância perdida... no meio daquela poeira, suado e impaciente, fiquei a um passo de ter minhas glândulas lacrimais ativadas. deve ser a poeira.
você pôe a carta de volta na caixa e programa a bomba para explodir de novo em dois ou três anos, na sua próxima mudança.
você pôe a carta de volta na caixa e programa a bomba para explodir de novo em dois ou três anos, na sua próxima mudança.
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